sábado, 1 de agosto de 2020


“Formas de voltar para casa” é o mais novo romance do aclamado escritor chileno Alejandro Zambra, lançado pelo selo Tusquets, da editora Planeta de Livros do Brasil. A obra já foi agraciada com duas premiações literárias: o Prêmio Altazor e o Prêmio do Conselho Nacional do Livro como melhor romance de 2012 no Chile. Em “Formas de Voltar para casa”, com uma narrativa envolvente, Zambra trata de um tema pesado: a ditadura de Pinochet no Chile e os reflexos desse período na vida de diversas famílias e de famílias diversas. De forma fantástica, o autor mostra, na obra, as muitas vezes em que o narrador precisou voltar para casa: ao fim de um terremoto ou às várias voltas à casa dos pais.

A história vai misturando memórias da infância do narrador, que vão retornando juntamente com seu reencontro com a personagem Claudia, com os fatos presentes de sua vida e assim, o narrador vai escrevendo um romance, ao mesmo tempo em que reconstrói, em sua mente, a verdadeira história dos tempos de chumbo no Chile. Em determinado momento, o narrador diz que era “filho de uma família sem mortos”, enquanto vários de seus amigos, incluindo Cláudia, tiveram a vida deles e de suas famílias devastadas pela crueldade da ditadura de Pinochet. O narrador, ao reconstruir suas memórias, se dá conta de que só tem uma família sem mortos porque seus pais eram de direita e, no fundo, idolatravam Pinochet.

Ao ligar os fatos históricos à vida pessoal das personagens, Zambra deixa o leitor arrepiado em alguns trechos da obra, como, por exemplo, quando Cláudia conta que sua família a levou para ver o Chespirito (Roberto Bolaños) no Estádio Nacional, em 1977,  num ato de amor à filha, já que sabiam que o Estádio Nacional era usado como local de tortura naqueles tempos sombrios, onde muitos de seus companheiros foram maltratados pelo sombrio regime. O livro é também uma linda viagem pela capital do Chile, Santiago, passando pela Paseo Humanada, o coração da cidade e por dose frias de Pisco Sour.

Um detalhe que chama a atenção na obra são os ciclos em que ela se encerra: a narrativa inicia e termina com a ocorrência de terremotos, que realmente aconteceram no Chile, nos anos de 1985 e 2010 e, com a genialidade que pertence somente aos grandes escritores, a narrativa também começa e termina com governos menos humanitários, havendo aí uma grande metáfora, que talvez passe despercebida para alguns leitores, entre os terremotos naturais e as duras formas de governo.

A difícil relação entre pais e filhos, que perpassa a obra, leva o narrador a dizer, no final, que “às vezes precisamos nos vestir com as roupas dos pais e nos olhar demoradamente no espelho”, levando o leitor a uma reflexão profunda sobre suas próprias relações familiares e sobre a familiaridade dessas relações com a política e os direitos humanos. Não é à toa que Zambra é considerado um dos mais relevantes autores da literatura latino-americana contemporânea, e “Formas de voltar para casa” deixa isso ainda mais claro.


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