Bonsai & A vida privada das árvores.
A injustiça literária que ocorre com Alejandro Zambra no
Brasil não é compreensível. O autor usa uma linguagem clara e explora fatos
cotidianos em suas obras, que, teoricamente, são acessíveis a todo tipo de
público. O que o diferencia é o olhar e a maneira de contar uma história. Em
seu “Formas de voltar para casa” (que já teve uma resenha publicada aqui), a
sensibilidade e a emoção arrebatam o leitor desde o início. Isso não é
diferente em “Bonsai & A vida privada das árvores”.
Um livro cujo título é tão chamativo pode assustar o leitor
comum. Afinal, o que se tem para falar sobre um bonsai ou sobre árvores? Elas
realmente têm uma vida privada? O que Zambra faz é mágico, pois ele transporta
seu leitor a duas novelas extremamente possíveis e plausíveis. Ele oferece ao
leitor a passagem para a mente de suas personagens, e o leitor, por também
saber que a mente humana funciona daquela maneira, permite se envolver com as
situações que lhe são apresentadas.
A primeira novela do livro, “Bonsai”, informa o leitor, no
primeiro parágrafo, o que acontecerá no fim da história, mas a inteligência e a
perspicácia de Zambra dominam aquele que se abriu a ele, de tal forma, que, a
partir do segundo capítulo, há o total esquecimento de que o final já foi
revelado. Com sua escrita e seus imbricamentos, Zambra abre as portas para a
vida de dois adolescentes que se conhecem e que se irritam mutuamente, mas que
mantêm um relacionamento sem muita seriedade. Em algum momento, há uma
separação e, depois, como na vida real, os dois se reencontram em situações
adversas e retomam o relacionamento, para haver uma nova separação. Essa
história, que é tão banal, abraça o leitor em todos os momentos, porém, na cena
final, o leitor sente vontade de abraçar Julio, pois todos sofremos com ele e
com o impacto que sua solidão causa.
Em “A vida privada das árvores”, Zambra cria tantas
expectativas no leitor que, se ele estiver sentado, ele provavelmente chegará à
ponta da cadeira, aguardando o que vai acontecer. Julián é o que somos quando
criamos diálogos e histórias que nos assombram em momentos de ansiedade e de
tensão. Talvez elas jamais ocorram, mas a sua existência, em nossa mente, as
fazem reais enquanto duram, e os seus resultados imaginários nos consomem como
se fossem verdadeiros. Ao leitor, cabe a árdua tarefa de torcer com Julián para
que a mãe da criança que ele ama, como se fosse sua própria filha, volte para
casa, volte para os dois. O desespero de Julián se transforma em nosso, e o
amor que ele sente pela criança nos invade da mesma forma.
No prefácio do livro, Zambra contempla o que o teórico
Walter Benjamin afirma sobre a arte de contar histórias: ela é a arte de saber
continuá-las. Zambra hipnotiza seu leitor ao continuar o que ele inicia e ao
dar a oportunidade de o leitor também fazer isso assim que elas acabam. Com
Zambra, andar de táxi, sem rumo, após uma notícia de morte e ajeitar a jaqueta
de uma criança enquanto chove deixam de ser atos comuns e passam a ser nossos
companheiros assim que fechamos o livro. Suas duas novelas nos acompanham por
um bom tempo, e isso se deve ao poder de sua narrativa, ao poder dos títulos
que elas carregam e, acima de tudo, ao do questionamento que ele faz em cada
linha: “afinal, o que é viver?”
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