quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020


Unindo amizade, culpa e redenção em seu romance de estreia, Khaled Hosseini não permite que o leitor tire os olhos do livro por um minuto. Em “O caçador de pipas”, o leitor acompanha os passos de Amir desde a sua infância até a idade adulta. Consideradas crianças de “raças” diferentes, Amir e Hassan quebram paradigmas e se tornam amigos, e não filho de patrão e filho de empregado, em um Afeganistão dividido por classes sociais. Dividindo o sentimento universal de amizade, os dois brincam, conversam e trocam favores: Amir sempre lê para Hassan, e Hassan não deixa que Amir perca uma pipa sequer nos campeonatos dos quais ele participa.
Em um dos campeonatos, quando Hassan corre atrás de uma pipa para Amir, ele é vítima de um crime hediondo, cometido por outro menino. Amir chega a tempo de ver o amigo ser estuprado pelo menino maior, mas se esconde e não ajuda Hassan. Atormentado por essa imagem e por sua inabilidade de socorrer seu melhor amigo, Amir esconde o relógio do pai nas coisas de Hassan, para que o menino e o pai sejam despedidos, saiam de sua casa e ele não tenha mais que conviver com a culpa de não o ter defendido. Apesar de ser uma criança, Amir leva o leitor ao sentimento de raiva, pois, afinal, Hassan é duplamente traído. Mesmo humilhado, Hassan não acusa o amigo pela mentira. Seu pai reconhece o ato do filho, e os dois partem, mas deixam uma eterna marca em Amir.
Algum tempo depois, para fugir da guerra no Afeganistão, Amir e Baba (seu pai) fogem para os Estados Unidos, onde levam uma vida completamente diferente da vida luxuosa que tinham em seu antigo país. Ao longo dos anos, Amir se casa, mas não tem filhos. À beira da morte, seu pai pede que ele volte ao Afeganistão para resgatar Sohrab, filho de Hassan – agora morto – dos Talibãs. O pedido não é em vão: Baba revela que Hassan era meio-irmão de Amir e que ele sempre soube a verdade sobre o relógio. Amir, com a culpa pesando infinitamente mais, faz o que Baba pede, pois “há um jeito de ser bom novamente”.
Para resgatar o pequeno, Amir viaja para o Afeganistão e, principalmente, para dentro de si mesmo. Ambas as viagens são dolorosas, mas o que ele vê em seu país de origem o afeta profundamente. Entretanto, nada o afeta mais do que saber que Sohrab teve um destino muito pior que o do pai e está ferido tanto por fora quanto por dentro: ele foi transformado em um escravo sexual. Depois de muitas tentativas e de muitos riscos, Sohrab, finalmente, é resgatado e vai, com seu recém-descoberto tio, para os Estados Unidos. Embora a última cena seja de esperança, o fim da obra é agridoce: a maior parte dos leitores espera que Sohrab se recupere rapidamente e seja feliz, mas a realidade mostra que o passado, às vezes, precisa de tempo e de confiança para ser curado.
Em tempos de guerras pessoais e morais, “O caçador de pipas” nos traz vários questionamentos. Será que é possível encontrar redenção depois de tanto tempo de culpa? Será que há atos realmente imperdoáveis? Será que um minuto pode realmente mudar uma vida toda? Será que realmente há amizade verdadeira e lealdade? Será que o passado pode ser esquecido? Independentemente de qual for a resposta a esses questionamentos, “O caçador de pipas” também traz a verdade universal de que o ser humano é complexo, que ele pode soltar pipas ou caçá-las, mas que sempre haverá alguém por quem faremos alguma coisa “mais de mil vezes” e que cada uma delas valerá a pena.

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